Jan 12, 2008

"Vivendo e aprendendo a jogar"...

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É o jeito. Cair, esmurrar, debater e, se possível, da melhor forma. Tentar amenizar os danos e... ...sim, aprender. Ter humildade pra isso, pra até tomar notas das lições, quando necessário. Mas excetuadas as filosofias, se a frase for entoada por Elis, sim, entoada, porque a Elis não se contenta e exibir o vozeirão, as firulas da garganta forte, ela também interpreta como ninguém; e no vinil, então, é só delícia pra audição. Um amigo, dos que conseguem ser engraçadíssimos sem tentar sê-lo, sem fazer “palhaçada” nenhuma, só falando com seu sarcasmo e leve carranca, mas leve, um semblante entre sisudo e divertido, me disse que, fisicamente, as ondas sonoras produzidas pelo vinil são mais perfeitas e “cheias” do que as produzidas pela leitura de um cd ou coisa que o valha. Fiquei feliz. Até que enfim posso comprovar porque ainda sou tão saudosista e só gosto de música vinda desses enormes e negros discos.

O verão não entra pela janela, nenhum pouco de sutileza. Invade, corrompe teto, janela, parede de tijolos sem furos resistentes até à maresia, mas claro que frágeis a essas ondas tão, tão quentes. A ilha ferve no mar morno, qual se estivesse em um caldo flamejante. Gente, gente, gente. Todos quase nus, contentes, crianças de todas as partes construindo castelos, fortes, muralhas, reinos da imaginação, correndo no mar, caindo nas ondas, chorando desesperadas. Crianças de todos os tipos brincando aos montes, às levas. Coisa mais bonita? O verão da ilha de Flor[ianópolis] é, certamente, caro ao imensurável pro monte de turistas. Gente disposta a pagar por diversão. Mas bonito, festivo e feliz, não há de se negar. Seria mais bacana ainda se toda essa gente de fora demonstrasse que lá de onde vêm se tem educação e bons modos. E pelo menos não sujassem a praia com porcarias, bitucas, papéis. Mas isso é um capítulo à parte, importantíssimo embora, especialmente considerado quão medonho é ver um marzão azul vomitando sujeira na praia.

E eu corrompida pelo despudor, corrompida pela efervescência quis também me dar ao luxo de ser um pouco turista. Por certo que não poderia pagar os preço que eles pagam nas praias visitadas ao fervor durante a temporada. Mas fui em uma das mais visitadas. Uma caipirinha num copo americano custa seis reais por lá. Um roubo, se visto o tamanhinho dela. Eu que gosto de apreciar da água russa, então, precisava de umas três só pra matar a sede. Não que eu exagere, é que os copinhos eram de licor! Mas paguei, paguei o preço delas até porque eu precisava do guarda-sol pra proteger minha brancura de recém voltada dos pampas do ensolarado e perigoso meio dia. Tinham alguns para serem alugados, mas, por certo, caros ao extremo também. Fico eu encolhida no guarda-sol do barzinho, na mesinha de plástico, tudo diminutivo de fato, degustando das caipiras. O mar – como pude tardar tanto a falar do mais importante? – o mar estava límpido, brando, algumas ondas grandes só pra divertir e assustar um pouco, mais lindo de ver. Dava pra enxergar os pés mesmo quando a água já batia no queixo. Dava pra mergulhar de cabeça e se deixar levar, como poucas coisas na vida ainda o permitem.

Na costa de areia branca tinha. Por algum motivo todos os turistas se aglomeravam em um único ponto. Tinha gente bonita, gente feia, velha, nova, divertida, carrancuda, bêbada. Todos unidos pela indistinção de umas sungas e uns biquínis. O calção do juiz é igualzinho ao do vendedor de picolé. As sungas, todas indubitavelmente transformando a maioria das formas masculinas em visões do grotesco. Não digo todas, mas a maioria. Todo mundo fica igual nessa situação de verão, na mesma condição. Todos só querem um lugar ao sol, uma cadeira ou canga à sombra, água fresca e um pouco de paz e cerveja gelada. Os guarda-sóis que já viram muitos verões gastos por igual. Não há quem não mereça isso, na verdade. Uma tardezinha de diversão. Jogar bola na areia, jogar o corpo na areia, jogar areia no outro e depois se arremessar furando ondas pra limpar todo o croquete das pernas. Não precisa exagero, nem dispêndio, nem bebidas caras, nem camarões no bafo, só disponibilidade pra alegria.

Hoje, hoje chove e venta bem forte. É sábado, mas não de sol, o que contraria uma premissa. O sol, exposto, queima, queimou-me. Nem adiantou gastar fortunas com caipira pra desfrutar de uma sombrinha naquele descampado enorme de areia, água e beleza. Pelo menos nos ardores nas costas, nos repuxões da pele vermelha pulsante, posso me lembrar de um pouco de felicidade iluminada pelo sol que tive. Que cobrou seu preço, como tudo o faz, incluindo o próprio ato de sorver e expirar o oxigênio, o ato mais vital. “Nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas aprendendo a jogar”.